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A razoabilidade na sanção de declaração de inidoneidade do licitante

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A razoabilidade na sanção de declaração de inidoneidade do licitante

Razoabilidade inidoneidade

Recentemente noticiou-se a aplicação da penalidade de declaração de inidoneidade de licitante que se recusara a manter proposta ofertada em processo licitatório¹, alegando a ocorrência de erro no preenchimento do formulário ou campo atinente ao valor proposto. A empresa licitante chegou a relatar o equívoco à autoridade administrativa responsável pelo Pregão, mas teve sua manifestação desconsiderada.

Assim, questiona-se, qual a razoabilidade de se aplicar uma sanção de tamanha gravidade à empresa que demonstra ter incorrido em erro escusável no preenchimento da proposta?

 

I. Das infrações e sanções administrativas:

 

A lei 14.133, de 1º de abril de 2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos) em seu art. 155, enumera os seguintes fatos capazes de gerar a responsabilização administrativa:

I – dar causa à inexecução parcial do contrato;
II – dar causa à inexecução parcial do contrato que cause grave dano à Administração, ao funcionamento dos serviços públicos ou ao interesse coletivo;
III – dar causa à inexecução total do contrato;
IV – deixar de entregar a documentação exigida para o certame;
V – não manter a proposta, salvo em decorrência de fato superveniente devidamente justificado;
VI – não celebrar o contrato ou não entregar a documentação exigida para a contratação, quando convocado dentro do prazo de validade de sua proposta;
VII – ensejar o retardamento da execução ou da entrega do objeto da licitação sem motivo justificado;
VIII – apresentar declaração ou documentação falsa exigida para o certame ou prestar declaração falsa durante a licitação ou a execução do contrato;
IX – fraudar a licitação ou praticar ato fraudulento na execução do contrato;
X – comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude de qualquer natureza;
XI – praticar atos ilícitos com vistas a frustrar os objetivos da licitação;
XII – praticar ato lesivo previsto no art. 5º da lei 12.846, de 1º de agosto de 2013.

Inicialmente cumpre salientar que na lei 14.133, no art. 155, o legislador busca penalizar as condutas que possam interferir na escolha da Administração Pública ou na execução do contrato, assim como colocar em risco a segurança jurídica dos licitantes e dos contratados pelo Poder Público.

Na mesma linha, no art. 156, a Nova Lei de Licitações descreve as sanções aplicadas aos atos citados anteriormente, sendo elas, advertência; multa; impedimento de licitar e contratar; e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.

Vale destacar que a declaração de inidoneidade é uma das sanções mais graves previstas no art. 156, da Nova Lei de Licitações, e poderá ser imposta aos atos previstos nos incisos VIII a XI do art. 155, bem como as demais condutas estabelecidas nos demais incisos, à exceção do inciso I, caso as circunstâncias do caso justifique a imposição de sanção mais grave do que a anteriormente prevista.

Ainda, rememora-se que a sanção de declaração de inidoneidade tem previsão também no art. 7º da Lei do Pregão (lei federal 10.520/02), que será revogada em abril de 2023, na forma do art. 193, II da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, lei federal 14.133/21.

Nessa perspectiva, a sanção de declaração de inidoneidade impede o responsável de licitar ou contratar no âmbito da Administração Pública direta e indireta de todos os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), pelo prazo mínimo de 3 (três) anos e máximo de 6 (seis) anos, período máximo que teve majoração, em comparação com a antiga norma, além da definição de período mínimo.

Para aplicação dessa pena e das demais, o § 1º, do art. 156, da Nova Lei procurou estabelecer parâmetros de proporcionalidade para a dosimetria da pena, quais sejam, gravidade, peculiaridades do caso concreto, agravantes e atenuantes, nos danos para a administração pública.

Insta salientar que, no esforço do legislador de estabelecer critério para aplicação das sanções, destaca-se que a norma se utilizou de conceitos jurídicos indeterminados, como “a natureza e a gravidade da infração cometida” e “as peculiaridades do caso concreto”. É de se realçar que o legislador buscou relacionar a dosimetria da penalidade com os danos causados à condução dos processos licitatórios, à execução dos contratos e ao Erário.

 

II. Razoabilidade – o erro escusável e os seus efeitos

 

Nesta seara de ideias, tem-se que o erro administrativo escusável pode ser perdoado, pois trata-se de uma conduta em desconformidade com a norma, cuja repressão disciplinar não se mostre condizente com o princípio da razoabilidade. Nesse ponto entende-se que não é resultado de ato intencional ou doloso, nem de negligência, imperícia ou imprudência e sim, da falibilidade humana.

Portanto, nessa categoria de erro não existe má-fé. Aquele que comete o erro não tem a intenção de influenciar na vontade do declarante, causando-lhe uma noção inexata ou incompleta sobre um fato, ou preceito.

O erro escusável, diante das razões acima apresentadas, afasta o dolo e a culpa, descaracterizando o elemento subjetivo do tipo infracional. Certo é que, para a imposição de penalidade, requer-se a comprovação de que a conduta se deu de forma dolosa ou culposa.

O responsável de licitar ou contratar pode cometer equívocos, ou desvios toleráveis no exercício das suas funções. A título de exemplificação, como é o caso relatado na introdução, tem-se o licitante que acredita estar preenchendo corretamente o campo do sistema destinado ao valor da proposta, buscando o melhor interesse da administração pública e agindo de boa-fé, mas que não compreende, por exemplo, a forma correta de preenchimento. Acresce-se, ainda, a multiplicidade de formatos que os sistemas eletrônicos de pregão licitatório utilizam.

Conforme relatado no caso exemplo, há, ainda, a informação de que o licitante alertou o pregoeiro acerca do equívoco cometido, o que permitiria à Administração Pública desfazer o equívoco e prosseguir na realização do certame.

Se o responsável de licitar ou contratar agiu de boa-fé e não culposamente, afirma-se, não há fundamento para a aplicação da penalidade mais grave prevista nas normas licitatórias, ausente o dolo ou a culpa no suposto ato infracional.

Neste ponto, sequer há de se falar em prejuízo à Administração Pública, já que, advirta-se, o processo licitatório visa obter a proposta mais vantajosa para o Poder Público, sem que, contudo, tal finalidade signifique o enriquecimento ilícito do Ente Público em prejuízo dos particulares. Assim, quando é evidente que o valor apresentado contém manifesta incompatibilidade com o valor de mercado, cabe também ao Administrador agir com boa-fé, aliás, conforme art. 2º, parágrafo único, inciso IV da lei federal 9.784/99.

 

III. Da presunção legal da boa-fé

 

Em complemento, no contexto exposto, deve ser alertado que a boa-fé é um princípio fundamental e geral do Direito brasileiro, segundo o qual se deve agir com base em valores éticos e morais e assim condiciona e orienta a compreensão do nosso ordenamento jurídico. Desse comportamento, deve a Administração adotar os seus preceitos na aplicação das sanções.

De acordo com José Augusto Delgado, o princípio da boa-fé é conceituado como “uma regra de conduta fundada na honestidade, na retidão, na lealdade e, principalmente, na consideração de que todos os membros da sociedade são juridicamente tutelados, antes mesmo de serem partes nos contratos”.

Portanto, em complemento ao que já exposto, entende-se que o responsável por licitar ou contratar tem sempre a seu favor a presunção que sua conduta está apoiada em boa-fé, presunção positivada no art. 5º, II, da lei federal 13.460/17. Assim, para que esta presunção seja afastada, é necessário a demonstração cabal da má-fé, não bastando a simples alegação de fato.

Conclui-se, portanto, que a motivação da penalidade surge quando o licitante não conserva, em sua conduta, a lealdade e a boa-fé, ferindo os princípios da moralidade, eficiência e do interesse público.

Por outro lado, é da Administração Pública o ônus de demonstrar a presença de dolo ou culpa na caracterização da infração, devendo aplicar a razoabilidade neste processo.

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1 Apelação Cível 1018385-66.2018.4.01.3400/DF, TRF -1ª Região.

 

Fonte: Migalhas.