Saber direito não é saber advogar
Falam alguns, que das carreiras jurídicas é sempre melhor escolher uma pública. No entanto, consideram dificultoso o
caminho dos concursos, e que ao contrário, é mais fácil ser advogado.
Ledo engano daqueles que assim pensam. Ainda que talvez difícil a aprovação nos referidos concursos públicos, nada fácil o
nosso atual exame de ordem, que preza pelo rigor, não para dificultar o ingresso, mas para admitir nos quadros da gloriosa
Ordem dos Advogados do Brasil somente aqueles realmente preparados para a árdua militância.
Necessário que seja assim, pois ao contrário do que possam dizer, peço vênia para afirmar que a advocacia é das carreiras
jurídicas, a mais difícil, que o digam aqueles que a exercem diuturnamente.
As dificuldades começam sim, desde o exame de ordem, tanto quanto qualquer outro concurso público, no entanto,
mais das vezes em decorrência do despreparo do bacharel por sua própria culpa, do que pelo eventual rigor das
questões formuladas.
Superada esta fase de provas, no limiar da profissão, não tenho dúvidas de que maiores serão os espinhos na advocacia
do que em qualquer outra carreira jurídica, em que pese as dificuldades também encontradas em todas as demais, e
não digo tão somente em relação ao sempre imprescindível retorno financeiro.
A maior dificuldade da nossa profissão se apresenta quando pura e simplesmente não nos preparamos para advogar. E
não basta saber direito, para saber advogar. Saber direito é apenas condição para exercitar a arte de advogar. Uma
condição inegavelmente muito importante, porém não é nada se o advogado não for um apaixonado e manter-se
preparado à ponto de submeter-se a outras condições, impostas na prática da advocacia.
Claro que também é preciso saber direito. Estudar sempre, com dedicação, buscando aprimorar e adquirir
conhecimentos para exercer a advocacia com sabedoria, convicção, e dignidade, no entanto, existem muitas outras
dificuldades inerentes ao exercício profissional.
A ansiedade e as incertezas são as primeiras causas que enfrentam os jovens advogados, os desafios, as
incompreensões, a indiferença com que costumam serem tratados nos fóruns, os prazos que parecem só correr para os
advogados, os embates judiciais, o conflito das partes, e o mais ingrato dos combates, ao defrontar com o colega de
profissão, cada qual buscando vencer a mesma demanda.
Não se pode olvidar ainda dos cuidados éticos, e de quantas vezes somos vítimas da falta de ética, das prerrogativas
ofendidas, da distorção da imprensa, do clamor público, da desvalorização da profissão, do desrespeito do próprio
cliente, e de tantas outras injustiças.
A advocacia é um sacerdócio, e necessita preparação sócio-psicológica, filosófica, cultural. Exige-se do advogado, a cada
dia, conhecimento especializado e prática inerente à profissão. Exige-se o exercício da advocacia na sua plenitude.
Exige-se cultura geral. Enfim, exige muito mais do que exigido em muitas outras carreiras jurídicas.
Malgrado esta realidade, não são poucos os advogados que superam as dificuldades, e nos servem de exemplo, como
norte de nossas condutas, que hão de ser baseadas em princípios morais, éticos e estatutários, sendo dever na nossa
profissão, comportar-se com probidade e dignidade das pessoas de bem, aprimorar-se no domínio da ciência jurídica,
buscar a distribuição da justiça e a propagação da paz, de modo a tornarmos merecedores da confiança do cliente e da
sociedade como um todo, honrando e engrandecendo ainda mais a nossa classe.
Na verdade, são as pedras do caminho que enobrecem o advogado, e o prepara sucessivamente para alçar voos cada
vez mais altos, granjeando a cada dia, mais e mais o respeito público.
O grande advogado é capaz de suportar a humilhação com a inteligência espiritual de que receberá a recompensa.
Divide com o cliente, a súplica, abstendo-se da soberba, que impede a súplica e traz como consequência a ausência de
recompensa. Aliás, a soberba não passa de uma ilusão de poder, como salienta o mestre Francisco Carnelutti, ao falar
sobre o advogado na sua festejada obra “As misérias do Processo Penal” (página 27).
Por outro lado, o mesmo advogado saberá se impor quando preciso. Invocará suas prerrogativas, demonstrará seu
talento ao pôr em prática o arsenal que a própria lei e a justiça coloca ao seu dispor na defesa de seu constituinte, sem
qualquer receio de antipatia aos que lhe assistem, em busca da excelência no cumprimento do mandato outorgado,
cuja certeza de bem cumprido, é uma das maiores satisfações do verdadeiro advogado.
A advocacia é a mais linda e apaixonante profissão, e mesmo que frágil até o momento seus estudos, mesmo que ainda
não tenha se preparado para advogar, não desanime e aprofunde-se o quanto antes, pois o exercício pleno da profissão,
com extrema dedicação, amor, e ânimo para sempre prosseguir, enfrentar, e superar as dificuldades, jamais
interrompendo a caminhada aos primeiros tropeços que encontrar, proporcionará o prazer, a experiência e as
condições materiais e pessoais necessárias para atingir o sucesso na gratificante arte de advogar, inclusive alcançando
independência profissional e financeira, que não há como negar é questão sempre aflitiva.